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“A gestão da floresta é muito mais abrangente do que apenas “limpar” mato” – Eugénio Fernandes Carvalho

Artigo de Opinião

Em traços gerais, no passado, a agricultura, a criação de gado e a floresta constituíam um sistema de gestão tendo por base o uso do fogo e o pousio. A paisagem era dominada por um agrossistema dividido em agricultura, em terrenos para pastagens e por matas com espaços florestais arborizados, onde cada um apresentava um regime próprio de aplicação do fogo.
Este sistema criava mosaicos interdependentes e cuja dinâmica era determinada pela comunidade humana. Este sistema permitia encaixar cada uma das peças que deviam compor a paisagem rural e manter os seus processos ecológicos, onde o fogo disponibilizava a energia necessária para alimentar e manter a estrutura e dinâmica do sistema.
Com o passar do tempo, todos percebemos que a paisagem foi perdendo de forma significativa uma das componentes que a formavam no passado e, naturalmente, foi perdendo capacidade de retenção do fogo antropogénico, então o fogo de origem natural alimentar-se-á do combustível acumulado e irá impor um regime alternativo de fogo – os grandes incêndios rurais.
Depois dos grandes incêndios – catastróficos – de 2017 em Pedrógão Grande foram-se desenhando politicas florestais para tentar reduzir e mitigar estes fenómenos nas nossas florestas e simultaneamente fomentar capacidade de resiliência das mesmas ao uso do fogo, não obstante, o sistema florestal é geracional e não produz efeitos a curto prazo porque deverá ser planeado e operacionalizado a médio/longo prazo.
Teríamos argumentos, conhecimento cientifico e técnico para escrever um sem fim de palavras e textos, mas de forma breve podemos também olhar para este fenómeno com diversas valências, através da aplicabilidade dos apoios comunitários e nacionais investidos na floresta, onde devemos refletir com seriedade:

  • Qual é a percentagem de apoio financeiro aplicado na floresta para gestão de matos em espaços florestais?
  • Qual é a percentagem de apoio financeiro aplicado para criação de mosaicos de silvopastorícia para fomentar a gestão de combustíveis vegetais?
  • Qual é a percentagem de apoio financeiro aplicado para uso de fogo técnico nas épocas invernais para gestão dos espaços florestais?
  • Qual a percentagem de apoio financeiro aplicado recuperar áreas ardidas?
  • Qual é a percentagem de apoio financeiro aplicado anualmente para combater incêndios rurais?

A gestão da floresta é muito mais abrangente do que apenas “limpar” mato, porque é um sistema dinâmico que varia conforme as circunstancias do meio onde está inserido.
Quando falamos da falta de meios e de operacionais, devemos refletir que muitos deles são bombeiros voluntários, fazem o bem em troca de nada, quando se trata de bombeiros sapadores, sapadores florestais e da força especial de bombeiros convém refletir na motivação que os levou a exercer aquela profissão no passado e quais as regalias que possuem atualmente, como por exemplo: o salário base está atrativo? O subsídio de risco é condizente com o risco de vida colocado na prática laboral? Os meios que possuem para esta prática são os mais adequados e oferecem a segurança necessária?
Antes de criticarmos a falta destes heróis trabalhadores, que colocam a vida deles em risco para proteger a nossa, devemos parar e refletir sobre todo o contexto envolvente para depois efetivarmos uma ação eficaz.
Ainda no ano passado, até dezembro de 2023, no exercício da minha atividade profissional, submeti um conjunto de várias candidaturas ao Programa “Vales Floresta” que consiste no financiamento para gestão de matos em espaços arborizados. O resultado das mesmas até agora é o mesmo do dia em que foi submetido – nenhum – inoperância é a palavra que se adequada neste momento às politicas de apoio à floresta.
Por cá, onde a propriedade é de minifúndio, toda esta gestão técnica é de extrema sensibilidade mas já temos experiência suficiente para perceber que estes fenómenos são cíclicos e há técnicas, formas e meios de conseguir reduzir este flagelo basta haver motivação através de uma vontade política bem vincada, sensibilidade dos proprietários de espaços rurais e cooperação de todos os agentes envolvidos.

Agora, resta-nos esperar que as condições meteorológicas contribuam para a minimização deste pesadelo para depois, quem de direito, consiga colocar “mãos ao trabalho” de forma eficaz sem olhar a “interesses” dúbios.

Eugénio Fernandes Carvalho
Licenciatura e Mestrado em Eng.ª Florestal
Técnico Credenciado em Fogo Controlado